Menu

Ilusão verde

Por Junior Garcia

O documentário produzido por Michael Moore, escrito e dirigido por Jeff GibbsPlanet of the Humans, levanta uma importante questão negligenciada no debate ambiental, mencionada como ilusão verde, os limites das tecnologias verdes ou ditas limpas. O enfrentamento das mudanças climáticas tem sido associado as tecnologias verdes, tais como biocombustíveis, energia eólica e solar e carro elétrico. O uso e os investimentos realizados nestas tecnologias verdes têm aumentado no mundo.

A ideia básica é que estas tecnologias, rotuladas como verdes ou limpas, contribuiriam de maneira efetiva e suficiente para a redução das emissões de gases de efeito estufa e a resolução dos problemas ambientais e sociais. Estas tecnologias gerariam emprego e renda verde e ainda reduziriam os impactos ambientais, se configurando na tabua salvadora do padrão vida da sociedade capitalista.

Acontece que a problemática ambiental, primeiro, não se resume apenas as emissões, mas envolve um amplo conjunto de impactos ambientais decorrentes da ação humana, tais como desmatamento, perda de biodiversidade, degradação pela mineração, poluição química, entre outros. Em segundo lugar, a Lei da Entropia – 2ª Lei da Termodinâmica mostra, de maneira irrefutável, que não existe tecnologia verde ou limpa como vendido pelos capitalistas e alguns “ambientalistas”, isso porque não existe nenhuma tecnologia moto perpétua ou moto contínua.

Por último, a resolução dos problemas sociais passa por uma profunda mudança na estrutura de apropriação dos benefícios gerados pelo sistema econômico. Os investimentos em tecnologias verdes sob a base econômica e social vigente, não é capaz de reduzir a desigualdade. Na verdade, a ilusão verde pode agravar a desigualdade a partir da sobre-exploração de recursos naturais não-renováveis, aumento dos custos de produção e de consumo de bens e serviços básicos nas sociedade mais pobres, entre outros. O aumento da desigualdade, como mostrado por Thomas Piketty em seu estudo O Capital no século XXI, apresenta uma tendência crescente no sistema capitalista, portanto, se configura um problema estrutural.

Neste contexto, as importantes limitações das tecnologias verdes não têm sido discutidas na academia e na mídia, por conseguinte, na sociedade, na formulação de política pública e nem no setor privado. A falta de reflexão sobre as limitações destas tecnologias tem criado uma verdadeira ilusão verde na sociedade, incentivando a produção e o consumo sem remorso – sem considerar as perdas ambientais e sociais. Agora o crescimento econômico é verde e limpo, portanto, as tecnologias verdes oferecem uma solução ganha-ganha: aumento da produção e do consumo, acompanhado da melhoria ambiental e social.

As tecnologias verdes, na verdade, se tornaram um negócio como outro qualquer do sistema capitalista, cujo objetivo continua sendo apenas proporcionar a manutenção do crescimento das economias – medida pelo Produto Interno Bruto (PIB) e, claro, do lucro monetário. Nem mesmo o setor privado acredita que estas tecnologias verdes sejam a solução para a problemática ambiental e social, como mostrado no documentário de Michael Moore, Planet of the Humans.

A produção de biocombustíveis, como biodiesel e etanol, é realizada sob bases não-renováveis, além de resultarem em outros impactos ambientais e sociais em seus processos agrícolas e industriais. No sistema agrícola, apesar do avanço tecnológico, por exemplo, destacam-se a continua necessidade de expansão da fronteira de produção (novas áreas ou substituição de culturas), uso crescente de agroquímicos (fertilizantes e agrotóxicos) e de maquinário e o uso intensivo do solo e da água, os quais têm aumentado sem precedentes a pressão sobre os recursos naturais.

No caso brasileiro, por exemplo, entre 1990 e 2018, a área plantada com soja e cana-de-açúcar, dois importantes insumos para a produção de biocombustíveis, aumentou 182%, passando de 15,9 milhões de hectares para 44,9 milhões – aumento de 29 milhões. Este aumento de área representa um território equivalente a três vezes a área de Portugal! Esta expansão territorial tem acirrado os conflitos fundiários e ambientais no Brasil. Infelizmente, o governo brasileiro tem contribuído para este acirramento com o desmonte de todo o sistema de proteção ambiental e social. Neste mesmo período (1990-2018), as estimativas indicam que a área desmatada no Bioma Amazônico totalizou 40,1 milhões de hectares; no Cerrado 22,1 milhões. Estas regiões abrigam importante parcela da área cultivada no Brasil, denominadas como o celeiro do mundo.

Dinâmica similar é observada no uso de agroquímicos (fertilizantes e agrotóxicos), que em sua maioria é de origem não-renovável. Em 2017, a agropecuária brasileira utilizou 16,6 milhões de toneladas em fertilizantes de origem não-renovável, sendo que 84% foi importado; em termos dos agrotóxicos foram 337,2 mil toneladas, 77% foi importado. Sem contar a contaminação causada pelo uso excessivo e intensivo destes agroquímicos no solo, na água, na atmosfera, nos animais e na saúde humana. Esta não é uma característica exclusiva do Brasil, mas se repete nos principais países agropecuários do mundo.

UFPR nas Redes Sociais

UFPR no Flickr
Universidade Federal do Paraná
Grupo de Estudos em MacroEconomia Ecológica – GEMAECO
Av. Prefeito Lothário Meissner, 632, térreo, Jardim Botânico
Fone(s):
CEP 80210-170 | Curitiba | Parana


©2024 - Universidade Federal do Paraná

Desenvolvido em Software Livre e hospedado pelo Centro de Computação Eletrônica da UFPR